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domingo, 28 de outubro de 2012

Man In The Music: Introdução IX "Quebrando Barreiras"

QUEBRANDO BARREIRAS






















Uma icônica foto de Michael Jackson na era Thriller,
quando a imagem e a música dele eram onipresentes.


 


Em virtude da natureza da arte dele, não deveria ser surpresa que a realização cultural principal de Michael Jackson – mais que o número de álbuns vendidos, prêmios, inúmeros protegidos e mesmo a filantropia – foi quebrar as barreiras que tipicamente dividiam a humanidade. Isso primeiro começou mais proeminentemente com raça, pois a popularidade massiva de Jackson forçou as radios, revistas e estações de televisão, como a MTV a, finalmente, abandonar o pretexto para a divisão ou a viabilidade mais fraca para o rock/R&B e abrir os portões da oportunidade para artistas negros. Houve, é claro, muitos outros artistas negros de sucesso antes de Jackson. Contudo, ninguém alcançou o estratosférico nível como Elvis Presley e os Beatles. Para muitos, simplesmente, parecia natural e inevitável que um artista branco fosse maior e melhor que um artista negro. Mas nos anos oitenta, Michael Jackson, finalmente, acabou com esse mito. Thriller não foi apenas o álbum mais vendido por um artista negro ou o melhor álbum da década; foi o álbum mais vendido, ponto. Maior que Elvis. Maior que os Beatles. Maior que os Stones. Para afro-americanos, portanto, foi uma enorme fonte de afirmação e realização. A música que eles inventavam estava, finalmente, sendo reconhecida como de alto nível. Como Greg Tate colocou: “Os negros amaram os progressos de Thriller, como se isso fosse a própria aríetes deles (contra) a apartheid”.
 
O sucesso dele, é claro, não era apenas significativo para afro-americanos. “Embora enraizado em experiências negras”, escreveu o crítico cultural Michael Ericson Dyson, “ele sentia que seria um crime limitar a música dele a uma raça, sexo, gênero, etnia, orientação sexual ou nacionalidade. A arte de Michael transcende todas as formas eu seres humanos tem pensado para se separarem e, assim, curou essas divisões, pelo menos, no instante em que estamos compartilhando a música dele”. Isso era uma universalidade sem fronteiras que Jackson sempre almejou: “Desde uma criança a uma pessoa velha”, ele explicou, “desde fazendeiros da Irlanda a uma dama que esfrega banheiros no Harlem... eu quero alcançar toda a demografia que eu posso, através de amor e alegria e a simplicidade da música”.
 
Isso é, na verdade, em grande parte, o que ele realizou.  Especialmente depois de Thriller, ele e a música dele foram abraçados em todo o mundo. “Michael é agora, muito simples, o maior astro da cultura pop universal”, escreveu a Rolling Stone, em 1984, “se não maior que Jesus, como John Lenon uma vez gabou para os Beatles, então maior que aquele grupo, ou qualquer outro ícone pop anterior”. Pelo início dos anos 90, os concertos dele foram vendidos desde a Alemanha ao Japão, da África do Sul à Austrália, Moscou e Praga. As músicas dele tocavam em todos os cantos do mundo. As letras das músicas dele eram mais bem conhecidas que os hinos nacionais.

Depois de Thriller, é claro, as coisas mudaram. Jackson permaneceu como o maior entretainer do mundo, mas se tornou incrivelmente polarizado. Michael Jackson sempre foi “diferente”; na verdade, as pessoas frequentemente se esquecem de como foi estranho que a mainstream América tenha, alguma vez, abraçado um homem que usava maquiagem, falava em voz aguda, vestia lantejoulas e vivia em uma miniatura da Disneyland. Enquanto os anos oitenta avançavam, porém, as excentricidades de Jackson se tornaram mais aparentes e pronunciadas, incluindo a “sempre-mudando” aparência física. Michael Jackson representava algo diferente e incomum; e americanos, em especial, tiveram dificuldade em processar isso. Ele foi estigmatizado como “esquisito” e “bizarro”. Pelo meio dos anos oitenta, o rótulo “Wacko Jacko” já tinha sido adotado.
 
        Jackson performa no Super Bowl XXVII em 1993, o canal recebeu o maior audiência de todos os tempos. Naquela época, a popularidade global de Jackson estava tão alta quanto sempre.



Nos anos subsequentes, a dominação cultural de Jackson começou a declinar, pois a mídia e o público, cada vez mais, o marginalizavam. Cada história de tabloides, cada escândalo, cada aparição pública fizeram com que ele parecesse mais estranho e assustador. Ele era um estranho que, mesmo assim, continuava fascinando as pessoas. Mas aqueles anos também permitiram a ele um novo papel cultural: já diferente, ele foi duplamente marcado como o “outro” e, assim, milhões de pessoas no mundo, que não se encaixavam, por qualquer razão, identificaram-se com ele. Enquanto a mídia implacável o ridicularizava e o coisificava, os fãs o viam como uma vítima da cruel e insensível cultura de exploração. Michael Jackson, eles sentiam, era uma alma pura e frágil, como um herói Keats, “cujas realizações não podiam ser separadas da agonia, que foi “espiritualizada” pelo declínio dele e... simplesmente, muito frágil para suportar as pancadas do mundo”. Steven Spielberg, uma vez, o descreveu como um “filhote de cervo em uma floresta em chamas”. Jackson, ele mesmo, frequentemente reforçava esta personalidade delicada. Ele era o inocente homem-criança, sempre compensando pela infância perdida, o seráfico cantor, que recebia inspiração dos galhos da “arvore das dádivas” dele.

Mas enquanto os anos noventa avançavam, ele se tornou, cada vez mais, disposto a atacar de volta a sociedade que o desprezou. Ele foi o arquetípico artista mal compreendido: um gênio excêntrico perpetuamente em desacordo com o mundo em volta dele, comprometido com a visão criativa dele, independentemente das expectativas culturais. Ele também estava disposto a abraçar o lado sombrio do Romantismo – o Gótico – para expressar o horror, isolação e a ansiedade de ser um “monstro” em um mundo monstruoso. No filme dele, Ghosts, de 1997, ele fez o papel do estranho, incompreendido intruso, enquanto um cidadão de “Vale Normal” tentava mandá-lo para fora da cidade. Mas ele não agiu como uma mera vítima inocente. “Se você quer ver/Excêntricas extravagâncias”, ele canta, “Eu serei grotesco diante dos seus olhos.” Na faixa final de Invincible, ele, igualmente, ostenta a personalidade “monstruosa” dele, provocativamente dizendo “você deveria se sentir assustado por mim”.
 
Nas últimas duas décadas da vida dele, portanto, Jackson desempenhou uma função cultural menos convencional, mas ainda valiosa. Ele não era mais o adorado supertar; ele era o supertar que falava para os marginalizados, da perspectiva dos feridos e esquecidos. Músicas como “We’ve Had Enough” e “They Don’t Care About Us”, expressam uma identificação e solidariedade com os oprimidos. A primeira é uma antidesgaste, a segunda, um grito de fortalecimento por todos que tinham sofrido injustiças. Era uma voz em desacordo com o estado anterior, denunciando a mídia em “Tabloid Junkie”, gritando hinos apocalípticos como “Earth Song” ou narrativas de grande desespero como “Little Suzie”.



Centenas de residentes olham enquanto Jackson performa em uma empobrecida favela no Rio de Janeiro, Brasil, a locação deste vídeo controverso, They Don’t Care About Us, dirigido por Spike Lee.



Pra a maioria da mídia e dos críticos, porém, esta importância cultural foi esquecida em favor de uma dispensa redutora. “Diferentemente dos Beatles”, observou Jay Cocks, do Times, “ (Jackson) teve uma vasta audiência, mas uma pequena consistência”. Em 1990, o renomado crítico musical Greil Marcus, famosamente, afirmou que Jackson foi a “primeira explosão pop a não ser julgada pela qualidade subjetiva da resposta que recebia, mas pelo número de transações comercias que isso provocou”. Ele foi, em outras palavras, uma distração, um fenômeno, um espetáculo com superficial ressonância. A arte e a influência dele, desse modo, foram facilmente reduzidas e racionalizadas. Elvis e os Beatles mudaram o mundo; Jackson foi apenas um artista comercial.




























 














Jackson no set do vídeo de 1992 dele, Remeber the Time.
Muitos fãs e admiradores viam Jackson como uma alma
pura em um mundo corrupto. Steven Spielberg o descreveu
como um “filhote de cervo em uma floresta em chamas”.



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