Segundo
a Ninguém: Raça, Representação e o Mal Interpretado Poder da Música de Michael
Jackson
O
próximo álbum dele, Thriller, tornou-se o álbum mais vendido por um
artista de qualquer raça na história da indústria musical. Também ganhou um
recorde de sete Grammys, quebrando barreiras de cor no radio e na TV e
redefiniu as possibilidades da música popular e uma escala global.
Mas
entre críticos (predominantemente brancos) ceticismo e suspeita apenas
crescem.“Ele não será esquecido rapidamente por ter virado tantas mesas”,
predisse James Baldwin em 1985.
Baldwin
provou-se profético. Em adição a uma enxurrada de artigos sobre a inteligência
dele, raça, sexualidade, aparência e comportamento, mesmo o sucesso dele e
ambição foram usados por críticos como evidência da escassez de seriedade
artística dele. Análises frequentemente descrevem a obra dele como “calculada”
“superficial” e “simplória”.
Renomados críticos de rock como
Dave Marsh e Marcus Greil notoriamente dispensam Jackson como o fenômeno de
música popular cujo primeiro grande impacto foi mais comercial do que cultural.
Elvis Presley, Beatles e Bruce Springsteen, segundo eles, desafiaram e
redefiniram a sociedade. Jackson simplesmente vendeu discos e entreteu.
O ponto de sua ambiçãonão era
dinheiro e fama, era respeito.
Não é dificil perceber as conotações
raciais em tal afirmação. Historicamente, esta demissão de artistas negros (e
estilos negros) como algo de pouca profundidade, substância ede pouca
importancia é tão antiga quantoa América. Foi a mentira que constituiu uma
ladainha. Era uma crítica comum dos espirituais (em relação aos hinos
tradicionais), do jazznos anos 20 e 30, de R & B nos anos 50 e 60, do funk
e disco, nos anos 70,e de hip-hop emos anos 80 e 90 (e ainda hoje). Os
guardiões da cultura não só não conseguiraminicialmente reconhecer a
legitimidadedesses novos estilos e formas musicais, eles também tendem aignorar
ou reduzir as realizações dos homens e mulheres afro-americanos que abriram o
caminhodeles. O Rei do Jazz,para os críticos brancos, não foi Louis Armstrong,
foi Paul Whiteman, o Rei do Swing não era DukeEllington, foi Benny Goodman, o
Rei do Rock não era Chuck Berry ou Little Richard, era Elvis Presley.
Dada esta história da coroação do
branco, vale a pena considerar por que a mídia teve problemas em se referir a
Michael Jackson como o Rei do Pop. Certamente suas conquistas mereciam tal
título. No entanto, até sua morte em 2009, muitos jornalistas insistiram em
referir a ele como o "Rei autoproclamado do Pop". De fato, em 2003, a
Rolling Stone foi tão ridiculamente longe ao ponto de atribuir o título a
Justin Timberlake. (Para manter o padrão histórico, apenas no ano passado a
revista desenvolveu uma fórmula de modo a coroar Eminem – além de Run DMC,
Public Enemy, Tupac, Jay-Z, ou Kanye West, como rei do Hip Hop).
Jackson estavabem ciente dessa
história e constantemente lutava contra isso. Em 1979, a Rolling Stone trouxe
em uma reportagem de capa sobre o cantor, dizendo que ela não se sentia que
Jacksonmerecia o status de capa. "Eu tenho dito repetidas vezes que as
pessoas negras nas capas de revistas não vendem cópias", disse um
exasperado Jackson disse a confidentes. "Basta esperar. Algum dia essas
revistas virão implorando por uma entrevista."...
Jackson, é claro, estava correto
(o editor da Rolling Stone, Jann Wenner, na verdade, enviou uma carta de
autodepreciativa reconhecendo o lapso, em 1984). E durante a década de 1980,
pelo menos, a imagem de Jackson parecia onipresente. No entanto, a longo prazo,
a preocupação inicial de Jackson parece legítima. Como mostrado abaixo, suas
aparições na capa da Rolling Stone, a publicação musical mais vista dos Estados
Unidos, são muito menos do que os dos artistas brancos:
· Mick Jagger: 29
· Paul McCartney: 26
· Bob Dylan: 22
· Bono: 22
· Bruce Springsteen: 22
· Madonna: 20
· Britney Spears:
13
· Michael Jackson:
8 (duas depois que ele morreu; uma com Paul McCartney, alias).
É realmente possível que Michael
Jackson, sem dúvida o artista mais influente do século 20, mereceu menos da
metade da cobertura de Bono, Bruce Springsteen e Madonna?
“Todas as formas de música
popular, desde o jazz ao hip-hop, do bebop ao soul, vieram da inovação negra.
Você fala sobre danças diferentes vindas da passarela, do jitterbugao
charleston, ao break- tudo isso sãoformas de dança negra... O que seria a vida
sem a música, sem a dança, a elegria e o riso e a música. Essas coisas são
muito importantes, mas se você for a uma livraria na esquina, você não verá uma
pessoa negra na capa. Você verá Elvis Presley, você verá os Rolling Stones...
Mas nós somos os verdadeiros pioneirosque iniciaram estas formas.”
É por isso que a tendência de
muitos críticos ao julgar o trabalho dele, teomando por base sempre padrões
musicais euro-americanos brancos, são tão equivocados. Jackson nunca se
encaixou perfeitamente em categorias e desafiou muitas das expectativas dos
entusiastas do rock alternativo. Ele estava profundamente enraizado na tradição
afro-americanos, o que é crucial para entender sua obra. Mas a marca de sua
arte é a fusão, a capacidade de unir diferentes estilos, gêneros e meios para
criar algo inteiramente novo.
Se os críticos simplesmente
segurassem letras de Jacksonsobre uma folha de papel ao lado de Bob Dylan,
então, provavelmente eles descobririam Jackson rapidamente. Não é que as letras
de Jackson não sejam substantivas (no álbum HIStory, ele
aborda o materialismo, o racismo, fama, corrupção, distorção da imprensa, a
destruição ecológica, abuso e alienação). Masa sua grandeza está na sua
capacidade de aumentar as suas palavras em voz alta, visualmente, fisicamente e
sonoramente, de modo que o todo é maior do que a soma de suas partes.
Ouça, por exemplo, às
vocalizações não verbais dele – os gritos, exclamações, resmungos, suspiros e
vernáculoss improvisados – em que Jackson se comunica além das restrições da
linguagem. Ouça o beatbos dele eo scatting; como ele estica ou acentua as
palavras, a facilidade como ele fazia o staccato de James Brown, a forma como
sua voz se move de grave para a sublime suavidade; as chamadas apaixonadas e
respostas, o jeito que ele se eleva tão naturalmente com coros gospel e
guitarras elétricas.
Nota da tradutora: scattin
significa pronunciar a palvra de forma muito rápida e initeligível. Staccato
significa pronunciar a s palavras de forma destacada e secamente.
Observe o alcance do assunto
abordado, o espectro de humores e texturas, a variedade espantosa (e síntese)
de estilos. No álbum Dangerous,
Jackson moveu-se de New
Jack Swing ao classico, hip hop a gospel, R&B a
industrial, do funk ao rock. Era a
música sem fronteiras ou barreiras e ressoou em todo o mundo.
No entanto, não foi até a morte
de Jackson, em 2009, que ele finalmente começou a gerar mais respeito e
valorização da intelectualidade. É um dos estranhos hábitos da humanidade
apenas apreciar verdadeiramente uma genialidade, quando ela parte. Ainda assim,
apesar do interesse renovado, as demissões fáceis e a disparidade na cobertura
de impressão permanecem graves.
Como ele proclamou com ousadia em
seu hit de 1991, "Black or White", "Eu tive que lhes dizer que
eu não sou um segundo a ninguém”.