Capítulo
Um
“Isto
É Assustador Para Você, Baby?”
No
memorial de Michael Jackson, Barry Gordy o chamou de “o maior entretainer que
já viveu”. Essa é uma declaração extravagante, embora exista evidencias para
apoiá-la: o fenomenal recorde de vedas, as turnês mundiais com ingressos
esgotados, o absoluto deleite que sentimos quando o vamos performar.
Mas
Michael Jackson também era um artista sério, e os impulsos do artistas, às
vezes, contradiz os do entertainer. Enquanto o entertainer se esforça para nos
agradar, o artista foca em explorar as ideias dele, mesmo que essas ideias nos
irritem ou nos aborreçam. Enquanto o entertainer oferece uma escapatória para
nossos problemas, pelo menos por um momento, o artista pode nos forçar e
enfrentar feias verdades. E, enquanto o entertainer nos conforta, muitas vezes,
nos acalmando com obras familiares que temos conhecido por anos, o artista
pode, às vezes, sentir necessidade de desafiar a audiência dele e,
intencionalmente, provocar-nos, desafiando nossas crenças estabelecidas, alterando
r nossas percepções e nos forçando a ver a nós mesmo e o nosso mundo de uma
nova maneira.
A
genialidade de Jackson era a habilidade dele em expressar esses impulsos
contraditórios com um corpo ágil e uma voz incrivelmente expressiva e um olho
cinematográfico. Nas performances de palco dele, Jackson era o entertainer
consumado, talvez o melhor que já vimos, e a dança e canto dele nos enche de
alegria. O objetivo dele era nos agradar, e ele nos agradou. Mas nos vídeos
dele, por exemplo, que ele chamava de curtas-metragens, o canto e a dança dele
eram servis à visão artística dele. Se essa visão exigia que ele se sentasse em
uma cadeira e não dançasse – como em Blood
on the Dance Floor –, então ele se sentava. Não importa o quanto isso nos
frustrasse. Na arte visual dele, Jackson era um artista sério, e o desejo dele
em expressar as ideias dele vencia o desejo em nos agradar. Mas se nós tomarmos
um tempo para olhar cuidadosamente e entender o trabalho, nós descobriremos que
Jackson, o artista, pode nos deslumbrar e inspirar tanto quanto Jackson, o
entertainer, uma vez nos deslumbrou e inspirou.
Considerar
Michael Jackson como um artista sério também nos leva a reavaliar o longo arco
da carreira dele. Visto como simplesmente um entertainer, a popularidade dele
atingiu o ápice em 1983 com o lançamento de Thriller e nunca mais atingiu tais
alturas novamente, com a careira dele entrando em um longo, doloroso crepúsculo,
depois que ele foi acusado de molestar um garoto em 1993. No entanto, vendo
Jackson como um artista, nós descobrimos que alguns dos mais interessantes
perspicazes trabalhos deles apareceram depois de 1993, pois ele lutou para
lidar com as consequências dessas alegações e a “súbita queda da graça” dele.
Além
disso, se nós dermos a Jackson o respeito devido a um artista sério e
conduzirmos uma análise focada da arte dele, isso revela uma surpreendente
complexidade e inteligência no trabalho dele – surpreendente porque muitas das
canções dele são tão bem conhecidas, que elas são tão familiares quanto as
canções de ninar. Mas Jackson era um sensível e perspicaz observador das
interações humanas e um apaixonado defensor da reforma, não apenas em hinos
notórios como “Black or White”, “Earth Song”, “Heal the World”, e “We Are the
World”, mas também sutilmente em vídeos como Beat It, Bad, Jam, Ghosts,
Thriller, Smooth Criminal e The Way You
Make Me Feel, um dos trabalhos mais mal interpretados dele.
Finalmente,
uma leitura focada da obra de Jackson revela que ele era um artista extremamente
dedicado e uma filosofia artística e visão bem desenvolvida – uma visão que,
definitivamente, leva a uma ampliada definição da arte em si, assim como um
profundo entendimento do que é possível através da arte. Os vídeos dele,
especialmente, podem ser interpretados como uma conversa sem fim sobre o papel
do artista; o relacionamento entre o artista e a audiência dele; e o escopo,
função, e o poder da arte, incluindo a habilidade da arte em acarretar
dramáticas mudanças sociais. Dar um focado olhar nos vídeos dele nos permite
ver ambos, o artista e o entertainer, com a tensão entre os dois provendo o
dinamismo que alimentou algumas das melhores obras dele.